A política de toga

A política de toga

É um fenômeno notável das últimas décadas. Os jornais têm dedicado cada vez mais espaço no caderno de política à Justiça Eleitoral, enquanto reservam para o Poder Legislativo páginas policiais ou colunas de fofoca. Entusiastas dizem que esse estado de coisas é o resultado de um desenvolvimento institucional. Desde 1988, o Brasil é um Estado de Direito, e os juízes não fazem mais que atuar à altura das expectativas que a sociedade deposita neles. Do lado oposto, críticos alertam contra o que chamam de judicialização da política. Eles acreditam que algo grave acontece quando a Justiça Eleitoral decide questões políticas. Embora enraizada no senso comum, essa crítica é descontextualizada e mira no alvo errado.

Mas de onde vem a crença de que há questões que têm de ser deixadas a cargo do Poder Legislativo e não podem ser objeto de decisão judicial? Certamente, não da Constituição. Ao contrário, ela diz que o Judiciário não pode deixar de apreciar nenhuma lesão ou ameaça a direito. Isso inclui casos em que a atividade política pode causar danos a indivíduos, seja a cidadãos comuns, seja àqueles que participam mais ativamente dos jogos de poder. E a Constituição é ainda mais clara ao atribuir à Justiça Eleitoral competência para, por exemplo, processar a prestação de contas de partidos políticos e cassar mandatos eletivos em casos de corrupção e abuso de poder. Ou seja, nada no texto constitucional proíbe juízes de interferirem em questões políticas, e, no entanto, essa ainda é uma crítica comum.

Há quem acredite que a proibição de que a Justiça Eleitoral judicialize a política vem de outra fonte, não da Constituição. Muitos pensam que há questões que, por sua própria natureza, deveriam ser deixadas a cargo do legislador. Embora esses críticos estejam certos ao intuir que existe um problema ali, eles miram no alvo errado. No século XVIII, pensadores como Beccaria e Montesquieu já insistiam que os juízes deveriam ser apenas a boca que pronuncia as palavras da lei. Mais recentemente, uma teoria popular na França dizia que atos de governo deveriam ser mantidos a salvo do controle judicial. E nos Estados Unidos, uma famosa doutrina defende que as cortes respeitem as decisões políticas tomadas pelos outros Poderes. O que está por trás de todas essas ideias é o mesmo que sustenta a crítica contra a atuação da Justiça Eleitoral: o receio de que as decisões tomadas em nome do povo pelos representantes democraticamente eleitos sejam arbitrariamente derrubadas por quem não se submete ao controle democrático.

Apenas nesses termos é que a acusação de judicialização da política deve ser levada a sério. Assim, a crítica não se dirige à natureza das questões colocadas sob controle da Justiça, mas a como se exerce esse controle. Em outras palavras, não se exige que o Poder Judiciário se abstenha de interferir na política, mas, sim, que a interferência seja amparada no Direito, não, no arbítrio. Portanto, é justificado que os jornais se preocupem com as decisões que a Justiça Eleitoral toma em casos difíceis como os que envolvem infidelidade partidária, antecedentes criminais de candidatos e cláusulas de desempenho para partidos. Não porque juízes necessariamente ultrapassam o poder que têm ao julgarem questões políticas, mas justamente porque eles detêm poder para julgar essas questões, que são tão caras à democracia, apenas e estritamente nos limites do Direito.

 

João Andrade Neto 

Analista Judiciário do Tribunal Regional Eleitoral de Minas Gerais.
Mestre e Doutor em Direito.
Professor de Direito Constitucional e de Direito Eleitoral.


Publicado em 20/12/15 no Caderno DIREITO HOJE do Jornal Hoje em Dia.

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