A Comissão Eleitoral e o voto feminino
Belo Horizonte, sexta-feira, 8 de janeiro de 1932. Está lá, na primeira página do MinasGerais, o órgão oficial dos poderes do estado: “A primeira reunião da Comissão Eleitoral – Debatido o caso da concessão do voto às mulheres”.
Estiveram presentes ao encontro o então ministro da Justiça e de Negócios Interiores do Governo Provisório do Brasil, Maurício Cardoso (que presidiu o evento), e os professores e jurisconsultos Sampaio Dória (SP), Juscelino Barbosa (MG), Mário Castro (PE), Bruno Lima e Sérgio Oliveira (RS), Adhemar Faria e Octavio Kelly (RJ). O relator foi João Rocha Cabral, da Subcomissão Legislativa, designada pelo presidente Getúlio Vargas. Assistiu aos trabalhos o consultor jurídico do Ministério da Justiça, Fernando Antunes.
Naquela reunião, o professor Sampaio Dória apresentou um esboço pela concessão plena do voto às mulheres, no que foi acompanhado por Bruno Lima. Já pela divergência manifestaram-se o ministro Maurício Cardoso e o relator João Cabral, que decidia que “o voto seria obrigatório para os homens até 60 anos e facultativo para as mulheres”. Cabral ainda completou: “Não acredito muito no voto feminino, pois as mulheres não se alistarão - uma só mulher dará mais trabalho que 10 homens para alistar-se”.
Durante o mês de janeiro de 1932, após longos debates acerca do tema, a junta revisora do Anteprojeto da Reforma Eleitoral e o governo Vargas decidiram pelo texto que está no art. 2º do Decreto 21.076, de 24 de fevereiro de 1932 (nosso primeiro Código Eleitoral): “É eleitor o cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo, alistado na forma deste Código.”
É preciso lembrar que a Revolução de 1930 tinha como um dos princípios a moralização do sistema eleitoral. E um dos primeiros atos do Governo Provisório de Getúlio Vargas foi a criação de uma Comissão de Reforma da Legislação Eleitoral, cujo trabalho resultou no primeiro Código Eleitoral do Brasil. Em 6 de dezembro de 1930, Vargas designou uma Subcomissão Legislativa, por meio do Decreto nº 19.459/1930, para estudar e propor a reforma da lei e processo eleitorais.
O grupo, composto por Assis Brasil, João Rocha Cabral e Mário Serva, julgou que sua tarefa deveria ser dividida em duas etapas: a relativa ao alistamento eleitoral (projeto publicado em setembro de 1931) e a referente ao processo das eleições.
Os integrantes da Subcomissão Legislativa entenderam, também, que deveriam ser ouvidos sobre o projeto, e, para isso, convocaram um grupo de professores e jurisconsultos de vários Estados brasileiros. Foi assim que nasceu a Comissão Eleitoral, encarregada de revisar os textos.
Especificamente sobre o voto feminino, se lermos atentamente o texto que está no art. 2º - “É eleitor o cidadão maior de 21 anos, sem distinção de sexo, alistado na forma deste Código.”, perceberemos que era uma concessão parcial, pois o voto só era concedido às mulheres casadas e com a autorização do marido, limitando as viúvas e as solteiras, que só poderiam exercer o sufrágio se tivessem renda própria.
Mais curioso ainda foi o que ocorreu em 1928 (quatro anos antes da sanção do primeiro Código Eleitoral, pelo presidente Getúlio Vargas), quando o Rio Grande do Norte tornou-se o estado pioneiro em conceder o direito de voto às mulheres. Naquele ano, as potiguares Celina Vianna Guimarães e Julia Barbosa foram as primeiras mulheres alistadas como eleitoras brasileiras. Ainda no Rio Grande do Norte, também naquele ano, a votação histórica no município de Lages, deu vitória a Alzira Teixeira Soriano, primeira prefeita do Brasil, eleita pelo Partido Republicano. Mas ela não terminaria o seu mandato, pois a Comissão de Poderes do Senado Federal analisou as eleições naquele Estado nordestino, pedindo a anulação de todos os votos que foram dados às mulheres.
O voto feminino no Brasil foi conquistado em 1932 e incorporado à Constituição de 1934 como facultativo. Em 1946, com a promulgação de uma nova Constituição naquele ano, somente as mulheres que eram funcionárias públicas eram obrigadas a votar. Já em 1965, com o advento do atual Código Eleitoral, o voto feminino passou a ser obrigatório sem restrições, com exceção das mulheres analfabetas, que puderam exercer o direito a votar com a promulgação da Constituição federal de 1988.
Em 8 de janeiro de 2015, a presidenta da República, Dilma Rouseff, por meio da Lei 13.086/2015, instituiu a data de 24 de fevereiro, no calendário oficial do País, como o “Dia da Conquista do Voto Feminino no Brasil”. A iniciativa de criação desta Lei foi da deputada federal Sueli Vidigal (PTB-ES). A data comemorativa relembra a sanção, pelo então presidente Getúlio Vargas, do Decreto 21.076/1932, nosso primeiro Código Eleitoral, em cujo texto foi inserido o direito do voto às mulheres em nosso país.
Publicado em 13/11/15