Os 10 anos do Referendo das Armas

Dia 23 de outubro de 2005. Uma consulta à população brasileira, por meio de um Referendo, decidiria se o comércio de armas de fogo e munição deveria ser proibido ou não no Brasil. Naquela data – um domingo -, 92.442.310 eleitores foram às urnas, e, deste total, 59.109.265 (63,94%) optaram pelo NÃO, enquanto a opção SIM foi a preferência de 33.333.045 (36,06%). Os votos brancos totalizaram 1.329.207 (1,39%), e os nulos, 1.604.307 (1,68%); a abstenção foi de 21,85% (26.666.791 eleitores).

Como a maioria decidiu pelo "não", sendo a favor da comercialização das armas e munições, a restrição continuou como estava desde o fim de 2003. O artigo 35 foi excluído do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/2003), que dizia o seguinte: art. 35 - É proibida a comercialização de arma de fogo e munição em todo o território nacional, salvo para as entidades previstas no art. 6º desta Lei".

A realização do Referendo das Armas foi promulgada pelo Senado Federal em 7 de julho de 2005 pelo Decreto Legislativo n° 780. No artigo 2º deste decreto, ficara estipulado que a consulta popular seria feita com a seguinte questão: "O comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil?". Os eleitores puderam optar pela resposta "sim" ou "não", pelo voto em branco ou pelo voto nulo.

O referendo de outubro de 2005, a maior consulta popular informatizada do mundo, funcionou como uma eleição normal. Os cidadãos votaram em suas respectivas seções eleitorais por meio de urnas eletrônicas.

Um dado curioso foi que nenhum estado teve maioria em favor da proibição – no Rio Grande do Sul, por exemplo, 87% dos eleitores votaram contra. Em Minas Gerais, a opção “não” também foi maioria - 6.155.748 (61,28%) de eleitores, contra 3.889.398 (38,72%) de eleitores que votaram no “sim”.

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) concluiu a totalização do resultado do referendo às 10h29 do dia 25 de outubro de 2005.

 

Entenda o contexto histórico

 

Para chegar a essa consulta popular, é necessário voltar no tempo – precisamente ao início de 2002, época em que o debate sobre a política do desarmamento entrou na agenda política do Legislativo Nacional, dada a sensibilização dos parlamentares diante dos altos índices de criminalidade em todo o País, que ocorriam desde o começo dos anos 2000.

Na esteira dessa motivação, a Câmara dos Deputados e o Senado Federal passaram a mobilizar-se a fim de fomentar o debate sobre a política do desarmamento, no intuito de subsidiar a construção de um novo marco institucional sobre o tema. Assim foi instalada pelos então presidentes do Senado, José Sarney, e Câmara dos Deputados, João Paulo Cunha, a Comissão Especial Mista de Porte de Armas para apresentar proposta destinada a combater o uso de armas de fogo.

O texto aprovado pela Comissão restringia o porte e o uso de armas, mas mantinha a produção, fabricação e comercialização no Brasil, ampliando o Sistema Nacional de Armas (Sinarm), instituído no âmbito da Polícia Federal, ao qual caberia identificar e cadastrar as armas de fogo no País. Esse texto trouxe, pela primeira vez, a previsão de realização do referendo acerca da proibição da comercialização de munição e armas de fogo, em outubro de 2005.

A partir do Estatuto do Desarmamento (Lei 10.826/2003), elaborado em 2003, foi instituída a “Campanha Nacional do Desarmamento”, determinando à população portadora de armas de fogo sem registro prazo de 180 dias para regularização, de registro ou porte perante a Polícia Federal, ou entrega espontânea da arma de fogo, com direito à indenização, a contar de 23 de junho de 2004, conforme Lei 10.884, de 17 de junho de 2004. Segundo dados do Ministério da Justiça, a campanha resultou na entrega de mais de 450 mil armas de fogo.

Contudo, o ponto mais polêmico do assunto foi a discussão sobre o art. 35 do Estatuto do Desarmamento, relativo à proibição da comercialização de armas de fogo e munição em todo o território nacional. Devido à complexidade do tema, por não ter sido consenso no âmbito do Congresso Nacional, foram os próprios parlamentares que aprovaram a realização do referendo em outubro de 2005. Somente no dia 7 de julho daquele ano é que a decisão final foi tomada. Naquela data, o Senado promulgou o Decreto Legislativo 780, que autorizava a realização da consulta popular sobre o desarmamento no Brasil.

No período entre 2003 e 2005, transitaram na Câmara dos Deputados 14 proposições importantes relacionadas diretamente ao tema. Foram apresentados cinco projetos de lei, três projetos de decretos legislativos e quatro requerimentos. As Frentes Parlamentares (prós e contra) promoveram vários debates sobre o assunto.

O texto que definia a pergunta para o Referendo das Armas - "O comércio de armas de fogo e munição deve ser proibido no Brasil?" - foi definido pelo Projeto de Decreto Legislativo 1.274/2004 (posteriormente transformado no Decreto Legislativo 780/2005). Esse texto, aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados, manteve a pergunta aprovada pelo Senado.

Merece destaque, também, a divulgação e importância do tema dada pela imprensa nacional, à época. No período de 1º a 20 de outubro de 2005, por exemplo, somente nos jornais Folha de São Paulo e O Globo, foram redigidas 399 matérias, dentre as quais 102 reportagens, 19 artigos assinados, 81 cartas de leitores, 35 chamadas de primeira página, 32 colunas assinadas, quatro editoriais, 42 notas em coluna, 69 aspas e 12 outros tipos de artigos. Somando o volume de texto desses dois jornais, tem-se um espaço de 58.894 centímetros quadrados, o que equivale a 30,6 páginas.

 

Publicado em 23/10/15