Como era o primeiro alistamento eleitoral do Brasil

Quem observa, atualmente, o chamamento da Justiça Eleitoral brasileira para o recrutamento biométrico de eleitores para as próximas eleições no nosso país – uma realidade que se consolida a passos largos no processo eleitoral, como meio para evitar, ainda mais, a possibilidade de fraudes -, não tem ideia de como era o primeiro alistamento eleitoral no Brasil, em 1881, ainda durante o Império.

Naquele período, o nosso país tinha cerca de 12 milhões de habitantes, que viveram a última década do Império conduzida por um Dom Pedro II desgastado política e economicamente desde os anos 1870.

Tudo começa em 1880, quando o Deputado Rui Barbosa, da Bahia, redigiu, a pedido do presidente do Conselho de Ministros, José Antônio Saraiva, o projeto de lei de reforma eleitoral. Em abril de 1880, o Ministério do Império enviara o documento à Câmara dos Deputados. Aprovado posteriormente pelo Senado, em janeiro de 1881 seria transformado no Decreto nº 3.029 e ficaria popularmente conhecido como Lei Saraiva (que, também, estabeleceu o primeiro título eleitoral brasileiro). Por intermédio dele, seriam instituídas eleições diretas no País para todos os cargos, à exceção do de regente, amparado pelo Ato Adicional.

O Decreto nº 7.981, de 29 de janeiro de 1881, trazia instruções para o primeiro alistamento após a Lei Saraiva, e trazia como características: estabelece que o alistamento de eleitores prefere a qualquer outro, vincula o alistamento na paróquia de domicílio (excluindo expressamente o domicílio profissional), descreve as provas admitidas de renda e elenca as classes que estavam dispensadas de comprovação de rendimentos, como ministros, conselheiros de Estado, bispos, presidentes de província, magistrados, oficiais das Forças Armadas, dentre outras.

Naquela época, o voto não era universal, e, para participar do processo eleitoral, requeriam-se 200 mil réis de renda líquida anual comprovada. O alistamento dos eleitores era de responsabilidade do juiz de Direito da comarca (naquelas em que havia um ou mais juízes de direito) ou do juiz municipal (quando houvesse mais de um termo sob a jurisdição dele).

De acordo com o Decreto 7.981, o registro do alistamento de eleitores era realizado em livros próprios, com um registro geral por comarca e registros parciais. O título de eleitor era expedido com a retenção de um canhoto, ambos assinados pelo Juiz de Direito. Publicava-se um edital para a retirada do título, que só podia ser feita pelo próprio eleitor. Havia disposições sobre as penas por omissões ou infrações no processo de alistamento. Havia, ainda, a ressalva de que se o condenado não tiver meios de pagar a multa, sua pena seria comutada para prisão.

O mesmo Decreto, ao tratar das inclusões no alistamento, determinava que nenhum cidadão seria incluído sem o ter requerido por escrito de próprio punho e com assinatura sua, afastando a inclusão de eleitores analfabetos. E estabelecia o horário da votação: das 9 horas da manhã até, no máximo, às 7 horas da noite.

Curioso era o ritual de votação: a mesa não conferia a cédula, e o eleitor assinava apenas um livro de presença. A apuração era feita pela própria mesa e publicada imediatamente após o seu término. As cédulas em branco não entravam no cálculo da maioria absoluta.

Muitos historiadores consideram que a participação política no Império é toda maculada por fraudes no processo eleitoral, como a exclusão e inclusão indevida de votantes, a participação dos “fósforos” (eleitores que votavam em várias seções e várias vezes), a apuração dos votos pela mesa, a influência de autoridades (públicas ou privadas), a violência e a coação.

A conclusão é que um conjunto de fatores que reduziam a participação popular, como a exclusão da cidadania ativa pela renda, com complicado sistema de prova, a exclusão de determinadas categorias e inclusão de outras (independentemente da renda), prejudicava a lisura das eleições, naquela época.

Publicado em 5/11/15